Por Marcio Dias (Diretor de Comunicação do SINDIPETRO-RN)

 A revolução digital, o teletrabalho e suas implicações para os trabalhadores

Tornou-se chocantemente óbvio que a nossa tecnologia excedeu a nossa humanidade”. – Albert Einstein

O teletrabalho surgiu ainda no século XIX, porém, com o desenvolvimento das tecnologias digitais e o avanço das telecomunicações nas relações de trabalho ganhou ainda mais força e espaço nos últimos vinte e cinco anos, impondo às tradicionais relações de trabalho outrora presenciais, novas contradições, ou seja, o trabalho remoto, ao tempo em que possibilita o controle patronal de forma “descentralizado” e “flexível” e, num certo sentido, restrito ao campo individual e coletivo no chamado “chão da fábrica”, ao mesmo tempo, empurra de forma direta, a luta de classes para dentro do espaço residencial trabalhadores – e não apenas isso – usando essas modernas tecnologias. O objetivo da empresa, em última análise, é manter níveis importantes de produtividade e de mais-valia.

Mas, o que é o teletrabalho? O termo teletrabalho ou trabalho remoto, segundo os estudiosos e a própria práxis do teletrabalho no revela, é uma forma de exploração dos trabalhadores que se expressa através do uso de computadores domésticos e telefones, de propriedade da empresa ou não, para permitir que estes possam executar suas atividades por um período parcial ou integral e de acordo com a conveniência e interesses da empresa em casa, em um restaurante, em um centro de teletrabalho ou em qualquer lugar onde ele possa ter acesso a tecnologia de WiFi, enquanto mantém contatos com colegas de trabalho, fornecedores, clientes ou um escritório central para resolver problemas e executar tarefas do cotidiano.

Mas, quais são as implicações do teletrabalho nas questões trabalhistas, jurídicas e, principalmente na consciência da classe trabalhadora? Aparentemente, e é até compreensível, que diante de cidades desumanizadas, ambientes de trabalho carregados de incertezas, sofrimento, violência, abuso e assédio moral, possa existir um certo nível até elevado de satisfação por parte dos teletrabalhadores – como estão sendo chamados – com as atividades remotas, em função das suas condições de trabalho e até familiares estarem repletas de pressões e estresses do dia-a-dia por razões obvias, porém, existem inegáveis implicações negativas que afetam sobremaneira a vida dos teletrabalhadores como, por exemplo, o aprofundamento da alienação e desumanização do trabalho, isolamento social e sobrecarga de atividades. Essas alterações contribuem muito fortemente para o individualismo exacerbado e a perda da ação coletiva dos trabalhadores enquanto classe para si, consciente do seu papel histórico e, inclusive, com relação aos seus próprios interesses imediatos, muito embora, isso seja pouco reconhecido pelos próprios teletrabalhadores.

Então, faz parte do chamado “novo normal” que as empresas adotem as vantagens das novas tecnologias digitais para explorar ainda mais os teletrabalhadores, mantendo as relações de trabalho nos termos “medievais” com que imaginam tirar proveito da situação por conta da crise capitalista e da pandemia do Covid-19. Tem sido assim. Muitas empresas viram e, nem disfarçaram, uma oportunidade para abrir sua caixa de perversidades para impor o teletrabalho com o objetivo de esmagar os direitos dos trabalhadores, de preferência, com a anuência dos deles próprios e, sob as “bençãos” do Covid-19 que, aliás, tem servido de pretexto para acelerar as medidas ultraliberais em muitas situações.

Mas, é papel das entidades sindicais polemizar e instigar a consciência política dos trabalhadores para que a classe questione primeiramente sobre o que é o teletrabalho? Quais os tipos de teletrabalho? O teletrabalho é trabalho autônomo ou subordinado? Existem diferenças entre o trabalho em domicílio e teletrabalho? Quais as vantagens e desvantagens do teletrabalho? O que diz a Constituição Federal sobre isso? Existe regramento na legislação trabalhista e/ou acordo coletivo de trabalho ou, ainda, convenções internacionais sobre essa matéria? Qual o objeto da prestação desse tipo de trabalho? O que os trabalhadores colocam a disposição da empresa em termos de energia e recursos para atender os interesses da empresa? Enfim, o que é mesmo esse tipo de relação e qual a proteção que os trabalhadores têm nessa condição?

São muitos os questionamentos e, certamente, os trabalhadores, através das suas entidades representativas, devem buscar respostas concretas e não se precipitar diante das chantagens e imposições da gestão das empresas que de oportunista e escabrosa implantam o teletrabalho a toque de caixa e ao arrepio das relações de trabalho e sem a necessária negociação coletiva, portanto, esse tipo de atitude merece o repudio dos trabalhadores na sua forma e conteúdo. Não que o teletrabalho por si só seja algo demoníaco, mas a situação não é tão simples e não pode ser conduzida da forma como a gestão de muitas empresas querem.

Por fim, essa questão não pode ser definida de forma açodada, nem pelos trabalhadores e, muito menos pelas empresas ou direções sindicais. Como se diz no antigo ditado popular “na dúvida não ultrapasse” e, neste sentido, somos pela opinião que devemos debater e tentar negociar com as empresas através de Acordo Coletivo de Trabalho a melhor alternativa para todos, na sua aparência e, principalmente, na sua essência.

*Esse texto foi escrito por Marcio Dias, sindicalista, sociólogo, militante do PCdoB e diretor de comunicação do SINDIPETRO-RN e contou com a colaboração de Paulo Neves, sindicalista e diretor da Federação Única dos Petroleiros (FUP), militante do PCdoB e diretor do SINDIPETRO-AM.